quarta-feira, 18 de abril de 2012

A "APARÊNCIA"

Nomes e aparência

O nome está intimamente ligado, quer à realidade dos seres individuais, quer à opinião pelo qual os "mortais" comunicam entre si essa realidade; assim, a Verdade não se revela por "nomes" e sim por "sinais", uma vez que os "nomes" são sinais humanos pelos quais, através da linguagem, se separa racionalmente cada objecto dos restantes. Atribuir um nome a um ser é criar um vazio entre as coisas e criar uma ruptura entre os seres.
Como a Verdade se identifica com o Ser, ao separarmos o Ser dos entes, introduzimos a Opinião face a Verdade.

VERDADE = OPINIÃO
     SER             ENTES

O conhecimento humano, ao diferenciar os entes, cria a Opinião e, por isso, atribui nomes. A Aparência ganha primazia em relação à Verdade.
O que Parménides nos diz, portanto, é as coisas não são o que parecem e a Verdade só se atinge ultrapassando os nomes que designam as coisas (ideal de unidade).

O estatuto da aparência

A teoria da aparência em Parménides tem um duplo sentido: por um lado é necessária a atribuição de nomes às coisas e à comunicação humana; por outro lado, o nome é ilusório porque separa o que ontologicamente é uno e contínuo. Isto vai ter consequências: não só enuncia a individualização, a identificação por nome e a separação dos entes entre si, como também justifica a existência de um "nome" para cada "coisa" e evidencia a sua necessidade como fundamento da comunicação por linguagem.

A superação da aparência e as determinações do Ser

O processo de compreensão noética do Ser é-nos dado pela ascensão mítica. O Ser e o Pensar noético são o mesmo, mas o pensamento pode ser "desviado" pelo processo de nomeação, tornando os homens "bifrontes". Tem que existir um "caminho" que afaste o conhecimento Verdadeiro da Opinião e da Aparência e esta "via" só pode ser aquela que separa ontologicamente o Ser e o Pensar ("Via da Verdade").

 
ENTE
(Opinião)
SER
(Verdade)
Descontínuo
Contínuo
Gerado e Destruído
Incriado e Indestrutível
Fragmentado
Inteiro
Princípio e Fim
Sem Fim
Temporal
Intemporal
Divisível
Indivisível
Múltiplo
Uno
Móvel
Imóvel

No fim, tanto o Ente como a Verdade são Limitados, pois para Parménides a falta de limite é uma imperfeição.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

O "PENSAR"

Parménides contribuiu decisivamente para a História da Filosofia na medida em que marcou um ponto de ruptura na forma como a Antiguidade concebia a "razão".
Segundo Parménides o "espírito" (por exemplo, o humano) está ligado ao Ser e o Ser, por sua vez, está ligado à Verdade. Assim, por lógica, o espírito não deve errar, pois está ligado ao Ser que está ligado à Verdade; contudo, os homens erram. Parménides apresentou a seguinte solução: é preciso ver os "sinais". Entende-se por "sinais" todo o pensamento baseado em argumentos, juízos e conclusões. Parménides surge, por isso, como o primeiro filósofo que incluiu o raciocínio lógico na função do "espírito".

O "SER"

Para Parménides, o Ser é indestrutível, inteiro, único, imóvel e completo. Esta ideia vai abrir caminho para as reflexões ontológicas, em que o pensamento conduz à verdade e a metafísica é subordinada à ontologia.

domingo, 15 de abril de 2012

O "PROÉMIO"

O "Proémio" é constituído por apenas um fragmento. É a parte vital do sentido filosófico da totalidade do pensamento expresso por Parménides e indicia-nos que o autor se encontra num tempo de transição histórica (como já foi abordado nos textos anteriores). Tem carácter religioso (pois a Verdade é revelada por uma deusa) e inicia um processo de iniciação gnóstica, ou seja, de transporte do mundo material para o espiritual, mais concretamente a "viagem" espiritual do conhecimento. É a passagem que constitui a passagem da multiplicidade dos entes para a unidade do Ser, da Opinião para a verdade, da Aparência para a Realidade e da Mudança para o Ser Único.

sábado, 14 de abril de 2012

O "POEMA"

Parménides (nascido a 515 a.C.) deixou o seu pensamento filosófico registado numa única obra: "Da Natureza" (embora se saiba que deixou também um conjunto de leis aos habitantes de Eleia).
"Da Natureza" é um poema escrito em hexâmetros do qual restam cerca de 150 versos. Está dividido em quatro partes: o Proémio, a Exposição dos príncipios em que assenta a via da Verdade, a Dedução de um conjunto de atributos e a Exposição da via da via da Opinião. Influenciou fortemente Homero, Hesíodo, Pitágoras, Píndaro e Ésquilo.
Lembremo-nos, porém, de que Parménides deve ser entendido imerso na cultura do seu tempo.

sexta-feira, 13 de abril de 2012

O CONTEXTO FILOSÓFICO DE PARMÉNIDES

Parménides de Eleia viveu num tempo de profundas convulsões sociais, políticas, económicas e mentais. Como foi dito a nova sociedade passou a usar a razão como instrumento de análise e, portanto, o novo mundo comercial e lógico não se satisfazia com as explicações caprichosas e contraditórias atribuídas aos deuses; para mais, descobriu-se que a Natureza possuía leis regulares, que a técnica poderia transformar a Natureza a favor do Homem e que esta também tinha uma lógica.
Neste âmbito, a filosofia de Parménides coloca essencialmente cinco questões: qual o fundamento de todas as coisas; o que é e como se conhece o Ser; qual o estatuto do Ser face à razão e aos sentidos; como se pode diferenciar a Verdade do Ser da mera Aparência Sensível; e como se pode diferenciar a Verdade universal da simples Opinião individual. No fundo, a questão fundamental da filosofia de Parménides é a busca de um Absoluto, sendo este o fundamento indubitável e inquestionável que permite estabelecer o sentido de todas as coisas. Assim, numa busca pela verdade e pelo absoluto os homens começaram a questionar-se sobre o fundamento natural de todas as coisas, ou Arkhé: são esses fundamentos o Infinito (proposto por Anaximandro), a Água (proposta por Tales de Mileto), o Ar (proposto por Anaxímenes) e o Fogo (proposto por Heraclito). Este último, Heraclito, foi um filósofo contemporâneo de Parménides que defendia que se Zeus (pai dos deuses) governa o mundo divino, já o Fogo governa com medida o mundo natural e a Lei governa o mundo humano; no fim, acima de Zeus, do Fogo e da Lei só está o Logos, ou seja, a razão cósmica.

 

Pitágoras, também contemporâneo de Parménides, contudo, afirma que o Número é a medida de tudo e a Harmonia numérica e geométrica são a relação formal entre todas as coisas; no fim, fica a razão e a lógica como fundamento de todas as coisas.
Parménides de Eleia, Tales de Mileto, Anaxímenes de Mileto, Anaximandro de Mileto, Heraclito de Éfeso e Pitágoras, no fim, perfazem o panteão dos primeiros filósofos, aqueles que tentaram exprimir pela razão e pela lógica uma nova forma de pensarem o mundo. São eles os Pré-Socráticos.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

ASPECTOS POLÍTICO-SOCIAIS DO TEMPO DE PARMÉNIDES

Os séculos VII e VI a.C. na Grécia

Nos séculos VII e VI a.C., a Grécia passou por uma profunda crise política e social causada pela transformação das culturas agrícolas, pelo desenvolvimento acelerado do artesanato e da pequena indústria e pelo intercâmbio com os povos da Ásia Menor. Efectivamente, o solo era infértil para cereais, apesar de ser rico para a vinha e a oliveira, o que se traduziu num fraco rendimento das colheitas; isto, aliado à inoperância dos instrumentos técnicos, conduziram a região à miséria e ao endividamento dos zeugitas (pequenos agricultores) face aos eupátridas (aristocratas). Assim, os zeugitas transformaram-se em escravos nas suas terras e os que evitaram esse destino emigraram ou dirigiram-se para as cidades em transformação, alimentando a indústria, fazendo parte da infantaria, produzindo mais produtos com mais qualidade e abrindo um maior mercado de consumo. Podemos dizer que foi graças à fuga dos zeugitas que as cidades atingiram o auge do seu desenvolvimento e que a Filosofia é fruto destas transformações.
No final do século VII, podemos encontrar uma Grécia com cidades fortemente consolidadas e movida por uma nova força social: os comerciantes; estes começaram a disputar o poder aos grandes senhores do campo, que também eram senhores da cidade. A economia hegemónica mercantil vence, portanto, a economia de subsistência agrária e as cidades são criadas com base  num novo ordenamento geométrico. Generaliza-se a moeda e o alfabeto, as leis passam a ser escritas (antes bastava a palavra de honra) e a razão passa a ser usada como instrumento de análise e de reflexão.

Primeira metade do século VI a.C.

Em 589 a.C. Sólon sobe ao poder, desenvolvendo e aplicando um conjunto de reformas. Estas tinham dois objectivos: primeiro, a desagregação dos antigos interesses dos eupátridas e, em segundo. a abertura aos interesses sociais emergentes dos novos habitantes da cidade. Assim, as medidas de Sólon são mais adequadas à nova vida mercantil e à nova racionalidade, passarei a citar: a distribuição dos bens herdados a todos os filhos, a abolição da escravatura, a desvalorização da moeda, o pagamento do juro das dívidas pelo seu total, a proibição de cortar ou danificar oliveiras e uma estrutura social assente na riqueza e não na genealogia. A Boulé, por seu turno, torna-se a sede do verdadeiro poder político.


ÓRGÃO POLÍTICO
GRUPO SOCIAL
Arcontado
Eupátridas
Boulé
Cavaleiros
Zeugitas
Ecclesia
Tetas
Cavaleiros
Zeugitas

As reformas de Sólon permitiram a emergência de uma forte classe média grega, dotada de um racionalismo geométrico assente na produção e comercialização de bens, adestrada no cálculo e que produz leis adequadas aos seus interesses.

Segunda metade do século VI a.C.

As medidas de Sólon, como foi visto, criaram uma ruptura entre as ancestrais instituições históricas homéricas e as instituições urbanas em vez de as contemporizarem. Sólon acabaria por ser exilado e sobe ao poder, em 561 a.C., o tirano Pisístrato; este vai criar um novo fluxo social a todos os grupos que estão menos ligados à posse de terra e mais ligados à comercialização dos seus produtos, igualdade na acumulação de riqueza e a centralização do Estado. As medias de Pisístrato, citarei igualmente, são: a imposição da "Coruja" na cunhagem da moeda, equivalência entre o médimno e o dracma (quem não pode pagar com dinheiro paga com cereais), incentivo ao cultivo da vinha e da oliveira, lançamento de bases estratégicas do comércio grego mediterrânico, reorganização da cavalaria do exercito e a passagem a escrito dos poemas homéricos "Odisseia" e "Ilíada". Tudo isto vai levar a um alto desenvolvimento das zonas urbanas ligadas ao comércio e às trocas cambiais; contudo, vai criar também uma alta oposição dos sectores mais vinculados às tradições ancestrais e à posse de grandes rebanhos e de grandes propriedades fundiária: com efeito, vê-se uma rivalidade entre o Arcontado e a Boulé, visto que o Arcontado travava frequentemente as leis propostas pela Boulé.
Em 508 a.C. Clístenes chega ao poder e ficaria para a História como o "pai" da democracia grega, visto que despoletou um conjunto de reformas de âmbito social e político sem intervir nas estruturas económicas da sociedade. Neste sentido criou-se o cargo de Estratego, nomeado pela Boulé e que retira o poder de comando militar ao arconte polemarco, até então supremo chefe militar da cidade. A ordem das antigas "famílias" é convertida em cem circunscrições territoriais chamadas "Demoi" que, por sua vez, se agrupavam em trinta "Títrias"; estas agrupavam-se em dez "Tribos"com representação directa nos órgãos do Estado. Finalmente, o nome do cidadão passava a ser designado pelo seu nome próprio e mais o nome do "Demoi" onde tinha nascido, o que se traduziu numa desvalorização da genealogia. Assim, com as reformas de Clístenes, a cidade é reorganizada na sua totalidade.
As reformas de Clístenes deram-se em dois momentos temporais: numa primeira fase; lutou-se pela hegemonia do poder político entre os eupátridas e o novo grupo social urbano; já numa segunda fase houve um favorecimento do grupo social urbano através da conquista do poder militar para os estrategos.


1.ª FASE
Igual a nível de poder
Arcontado
Boulé
Poder inferior
Ecclesia

 
2.ª FASE
Igual a nível de poder
Boulé
Estrategos
Poder inferior
Ecclesia
Poder simbólico
Arcontado

Em finais do século VI a.C. está desenhada a nova forma de organização do Estado, que assenta portanto num poder económico mercantilista, com novos grupos sociais urbanos, expansão marítima nos negócios, de estrutura mental racionalista, com prevalência do direito e do alfabeto escritos e com moeda a circular. Neste âmbito, a Filosofia inicia-se como substituto do mito e da magia enquanto antigas formas dominantes de pensamento.